Meu corpo feito de carne e de osso. Esse osso que não vejo, maxilares, costelas, flexível armação que me sustenta no espaço
que não me deixa desabar como um saco, vazio, que guarda as vísceras todas funcionando (...)”. Ferreira Gullar
O corpo que conhecemos é um corpo orgânico, findo. E, acima de tudo, sensível ao mundo exterior, mas que internamente carrega em si sua origem, uma herança genética determinante. Será este o único corpo que conheceremos?
Surge desta pergunta uma dúvida desconfortável e não uma certeza categórica. “Gosto tanto do meu corpo como qualquer um, mas, se eu pudesse viver 200 anos com um corpo de silicone, eu o faria”, afirma Danny Hills, inventor, cientista, engenheiro, editor de jornais científicos e um dos fundadores da Corporação das Máquinas Inteligentes - um grupo de consultoria na área que tinha entre seus clientes a Schlumberger, American Express e a NASA.
Em um artigo intitulado “Por que o futuro não precisa de nós?” – no qual cita a declaração controversa de Hills, Bill Joy, também cientista da área, faz questionamentos sobre o futuro da espécie e da própria existência ontológica do ser humano diante de previsões como a transferência de nossas consciências para a estrutura do que poderia ser um robô. O corpo orgânico seria um elemento obsoleto e substituível por outro que fosse capaz de eternizar a espécie na Terra.
A questão suscita discussões polêmicas que introduzem questionamentos do tipo: o que faz de nós seres humanos? A consciência, encarada aqui como uma dimensão metafísica, dispensa a complementaridade do corpo orgânico? Dispensá-lo faz com que deixemos de ser humanos?
Para Roger Dutra, professor do Departamento de História da Universidade Federal de Minas Gerais e com tese de doutorado no assunto, o mais preocupante é “a externalização e a mobilização de recursos na direção da criação ou, melhor dizendo, na possibilidade da criação desta eternização”.
O professor alerta que o problema “hoje é que há um conjunto de potenciais ações tecnocientíficas das quais sabemos toscamente como realizá‑las e nem ao menos tangenciamos o seu significado e a extensão de suas implicações”. Além de questões históricas, filosóficas e éticas advindas da onipresença das novas tecnologias nas nossas vidas, tratar de uma evolução, transformação ou até extinção do corpo humano requer uma discussão potencializada há mais de um século.
[continua no próximo post]
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