A máquina, o ser, aquilo
O processo evolutivo que hoje nos ameaça o corpo pode ter sido introduzido em nossa sociedade a quando começamos a usar próteses para corrigir certos defeitos, como acredita a doutoranda Claudia Benedetto. Passamos a aceitar a idéia de sermos um pouco máquina.
A inserção de próteses não pode ser considerada uma prática eugênica em si, porque é feita no já indivíduo formado. Mas Benedetto supõe que “teremos este tipo de questão ética em um futuro próximo, quando a tecnologia molecular permitir alterações específicas diretamente no genoma dos indivíduos”.
Neste sentido, o professor Roger Dutra lembra que “Paul Virilio argumenta que quando começamos a pensar na possibilidade de dotar de próteses indivíduos que realmente não precisam delas [...] rompe‑se o fino limiar que separa a correção de uma dificuldade da modificação hedonista e despropositada”.
Nos acostumamos ao controle cada vez mais eficiente da evolução da nossa espécie. Ainda assim, não é possível dizermos se a possibilidade de extinção do corpo se concretizará. Mas hoje em dia vislumbram-se algumas delas. Dos casamentos entre “superiores” às pesquisas com células-tronco, trilhamos um caminho do qual dificilmente conseguiremos desviar-nos. E, por isso mesmo, é crucial que percebamos que “a situação contemporânea nos impele a abrir publicamente esse debate”, ressalta Dutra.
O que define o comportamento do homem contemporâneo é a arrogância na aplicação de tecnologias para ostentação de poder. Na opinião de Dutra, “a genética é, atualmente, mais uma forma de tecnociência do que uma representante do tempo idílico e quase-nostálgico em que era possível acreditar nas ciências puras e desinteressadas”.
“Não temos o mínimo de segurança tecnocientífica. Nem sequer acumulamos debates sociais, filosóficos ou morais minimamente satisfatórios que nos permitam empreender as graves intervenções a que estamos atualmente dispostos”, detalha Dutra. Já para Benedetto, “a sociedade deve mudar o enfoque” e “isto inclui aceitar a diversidade humana como um fato intrínseco”.
São várias vertentes e várias vozes clamando que o futuro precisa ser revisto. Na opinião da doutora Heloísa Pena, “a manipulação genética da espécie humana levanta questões éticas inéditas, pois o que está em jogo é a própria natureza e imagem do homem. A prudência e o raciocínio hipotético são fundamentais nesta ‘co-evolução entre ciência e ética’. Acho que são questões que devem ser discutidas pela comunidade global”.
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